A (des) crença dos desacreditados: Por que se descrê nas escolas públicas do Brasil? *

Jocivaldo dos Anjos²

“Estar sendo é uma condição para ser”. Assim afirmou uma das figuras mais brilhantes que esta terra viu passar por ela e se eternizar: Paulo Reglus Neves Freire. Entre os utilizados nas universidades de língua inglesa em 2016.  http://g1.globo.com/educacao/noticia/2016/02/so-um-livro-brasileiro-entra-no-top-100-de-universidades-de-lingua-inglesa.html.
Ao Freire afirmar isto estava defendendo que não é possível ser sem o comprometimento, pela metade, um ser meia boca. Não! Ele defendia que é impossível alguém afirmar que é algo sem estar diariamente comprovando o isso pelas suas praticas, alias, ele defendia ainda que são as praticas que comprovam as teorias.
Utilizar-me do pensamento do grande Freire para iniciar este texto, faz parte da pretensão minha sobre a discussão da crença e da descrença. Porque desta maneira demonstrar a crença é a única possibilidade existente para a comprovação da existência da mesma. Sem isso todas as palavras emitidas entram para o rol da verborragia, da falsidade e da demagogia. E, vale lembrar que o uso do prefixo (des) é paradoxal à mesma. .
Sempre em meus textos costumo iniciá-los explicando a transitividade verbal; isto porque o verbo é o que indica a ação e se faz importantíssimo entendermos qual a intenção daquele verbo, qual a sua proposição, e, sabendo  não existir escrita e fala sem intenção, procuro encontrar as intenções nos núcleos das orações.
Este verbo, que trato agora, o verbo crer ele é um verbo transitivo direto, pois quem acredita o faz por algo ou por alguém. Interessante é que ninguém acredita naquilo que não ver ou que ninguém o ensinou, logo temos aí explicação para o fato de muita gente não acreditar na capacidade do povo da zona rural. Um povo que os nossos livros didáticos invisibilizou por séculos e ao povo negro que só foi dado o papel de trabalhos domésticos ou escravidão. Isso sem se falar de demais categorias  esquecidas como indígenas com as histórias folclóricas, mulheres com papéis internos e subalternos , homossexuais que ainda nem entrou de forma alguma... e por aí se vai.
 Vejo logo acredito, ou não! Mas, com certeza sem ver sempre desacreditarei. Mesmo não sendo um São Tomé, alias, a religião também tem sua intimidade com este verbo, pois é nela qoue se sustentam para convencer as pessoas e com isso buscar sempre o reconhecimento, respeito e hegemonia. Deus deve ver o não visto visto. A onipotência, onipresença e onisciência. Mesmo, e e necessariamente - , sem a visibilidade. Entretanto, vale lembrar: o povo que acredita em Deus só o faz porque alguém o convenceu e porque o materializa ou imaterializa em alguma coisa, sem isso seria impossível a crença.
Sabendo que quem crê crer crer em algo ou em alguém acabo por concluir que muitos professores  ja não crêem mais em si, uma vez que muitos lecionam em escola publica e, no entanto, seus filhos freqüentam ou estudam em escolas da rede privada por diversos motivos e explicações possíveis.  Pergunta-se: estas pessoas acreditam em si próprias? Desacreditam em seus colegas? Desacreditam em toda a rede? Ou desacreditam no público que frequentam estas escolas a ponto de não querer que seus filhos se misture a estes e, tal qual o Brasil fez no início do século XX com a escravidão renegando a “mistura”? Perguntar não ofende, né?
Se utilizar de discursos com a escola publica não tem qualidade ou falta de professores, baixos salários etc. não creio ser um discurso que me convença, mesmo tendo a pouca idade que tenho. Para mim acreditar em algo é defender este algo, é lutar por ele, e, infelizmente vejo muita gente jogar a toalha quando se trata de escola publica.
Concordo com os dizeres do Senador Cristovam Buarque quando afirma que as escolas brasileiras terão qualidade quando o filho do rico e do pobre dividir o mesmo espaço, do político e do eleitor, do preto e do branco, porque parece haver uma intencionalidade do sucateamento da mesma: A construção dos sujeitos e dos não-sujeitos ou objetos; A construção dos lugares e dos não-lugares.
O fato da não freqüência de filhos de professores na maioria das escolas públicas contribui enormemente para que se aumente a cada dia a deficiência neste ensino. Alguns motivos explicam esta posição. Primeiro porque se quem freqüenta é a população de mais baixa renda e com menos instrução diminui o poder dos pais e das mães sobre o ambiente escolar, devido ate mesmo o fato de sua limitação em muitos temas, dentre outras coisas; segundo porque o comprometimento quando os filhos estão freqüentando aumenta, afinal ninguém quer  o mal para seu (a) filho (a), dentre outros tantos motivos.
Se o salário está baixo e as condições estão desfavoráveis não é se eximindo do que tomou como oficio que ela melhorará, com certeza é fazendo o caminho inverso. Para estes colegas indico o livro do Professor Paulo Freire Professora Sim, Tia Não, onde ele discorre sobre o papel político que um professor tem em sala de aula e na vida dos seus educandos, das lutas por melhores condições de trabalho etc.
Desconfio sim, intransigentemente, que estes colegas acreditem ainda no ensino publico, pois eu demonstro minha crença a partir de minhas ações. Claro que para muitos professores isso soa como algo muito chato e que, com certeza implicará em escutar muitas criticas depois e muitos até utilizarão fragmentos de pensadores renomados, quiçá até do próprio Freire, onde em Pedagogia da Autonomia ele afirma que não é necessário que as pessoas morem na favela para saber que a vida do favelado é ruim e a partir daí se trace um paralelo com a escola publica e as instituições particulares. Para estes solicito apenas que observem a dimensão política de cada afirma cada problema e que pese as possibilidades de intervenção em cada local.
Acredito que estes e estas nobres colegas desacreditam tanto no seu labor que preferem passar para outrem a missão de cuidar dos seus filhos, devido a sua incapacidade de contribuir para o seu desenvolvimento através da educação formal.
Reconhecer que o ensino público nosso hoje é defasado faz-se obrigatório para mim, pois na vivo na lua, mas acreditar na possibilidade de melhorá-lo faz-se imperioso também , afinal de contas quando decidi ser professor eu sabia de todas as dificuldade que enfrentaria e topei aceitá-la. Se hoje percebo que minhas convicções ruíram com o tempo e tive a obrigação de adotar outras convicções, - Sem problemas! Mas que então eu mude de local de trabalho, porque a escola publica deve ser lugar de vendedor de sonhos e de construtores de amanhas com mais brilhos e possibilidades.
Imaginem o que significa eu preparar uma aula para ministrar com uma turma sem acreditar nos meus alunos devido a sua condição social, a sua pobreza, as condições difíceis de vida e mesmo assim eu ainda ter a vileza de ministrá-la simplesmente por conta de salário. Pergunto: o que diferencia minha prática das de políticos corruptos que assumem postos simplesmente por conta do dinheiro e do seu desvio. Parece-me que tecer a critica à políticos em nosso país ficou mais fácil do que assumir as parcelas de culpa de cada um.
Conheço vários professores que atuam na rede publica e privada e para as duas tem conteúdos distintos, metodologias distintas e comprometimento distintos. Não que eu seja contra que as pessoas lecionem neste sois espaços, se isso se faz uma necessidade para ele ou ela que o faça então, sem problemas. Entretanto, para mim estas pessoas que adotam distinção no tratamento do publico e do privado são formadores numa escola de políticos (privada) e em outra (pública) de eleitores; numa se forma os patrões e na outra os empregados... Talvez estes caros professores que agem assim estejam necessitando ler sobre a Teoria da Curvatura da Vara, do Lênin.
Enquanto educador for (dentro ou fora da sala de aula) acreditar nas pessoas não será apenas uma opção minha, será a obrigação que o meu oficio me impõe. E, acreditar em mim é, com certeza, a maior lição que darei aos meus alunos, demonstrando isso através dos meus gestos e das minhas ações.












1. Vivenciando diariamente o tratamento dispensado à escola publica e vendo praticas de alguns professores é o que me motivou a escrever este texto. Apenas no sentido de exteriorizar o que percebo. Afirmo, sem medo de errar, que o problema da educação brasileira nas escolas publicas não estão apenas nos baixos salários ou em questões de ordem de infra-estrutura das escolas, estão sim em um problema de ordem política, de concepção do que é o ensino e do que cada um se dar para melhorá-lo constantemente.



2. Jocivaldo dos Anjos é jovem tem 28 anos, negro, estudante do curso de Letras com Espanhol pela Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS, militante dos movimentos sociais e populares no Estado da Bahia, ocupa o cargo comissionado de  Secretario de Agricultura no município de Antonio Cardoso.

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