O CAMPO DA JUVENTUDE NA JUVENTUDE DO CAMPO¹
Jocivaldo dos Anjos²
Iniciar este texto com o trocadilhando é trazer a tona, para além de um debate aprofundado e problematizador sobre a juventude no e do campo, também discutir o raio de atuação, ou seja, o campo em que a juventude do campo se insere nas propostas apresentadas pelos governos e pelos segmentos sociais destes.
Discutir se as propostas respondem as demandas da maioria dos jovens e se quem produz estas demandas estão a produzindo para responder a questões idiossincrásicas da sua geração ou da sua representação (entidade ou governo) deve ser eminente na sociedade juvenil atual. Ficam estranhas algumas defesas à luz das teorias e das vivencias.
Juventude esta que pela primeira vez na história do Brasil se reconhece enquanto jovem, que se coloca enquanto jovem, que produz enquanto jovem, e, que não é simplesmente, - não querendo desconhecer o papel de outras gerações, principalmente a tão badalada década de 60 -, mas, que consegue mobilizar em processos de conferencias 1.000.000 (um milhão. Que saem dos seus rincões mais distantes deste país para mostrar sua cara em espaços de construção coletivas e de aparição pública. Esta geração está dizendo algo, mas tem ainda muita coisa a dizer e necessita que muitos ouvidos os escutem e a muitas mãos executem .
Desde a o fim da década de 1990 que tenho participado de movimentos sociais e a partir de 2005 iniciei uma trajetória no movimento juvenil, com recortes: negro e rural. Dediquei maior tempo ao movimento rural devido o fato de entender uma maior necessidade de visibilização deste segmento. Nestes espaços percebi que há um processo de invisibilização da juventude do campo por alguns motivos:
Primeiro: devido o fato de a juventude urbana representar maior quantitativo populacional as políticas públicas são “testadas” primeiro na cidade, para dar uma resposta mais imediata para a sociedade; a juventude fica para o segundo momento, o segundo plano.
Segundo: as organizações juvenis convivem em espaços em que o processo de comunicação é ainda muito precário e as ações promovidas pelas juventudes nos diversos campos não ganham relevo a ponto de se tornarem referências.
Terceiro: nos movimentos juvenis do campo a autonomia ainda é algo muito incipiente. Como nasceram a grande maioria no seio dos sindicatos de trabalhadores rurais, com uma matriz machista e conservadora, principalmente no campo das gerações – e também lhes faltou formação para tal – não conseguem conceber a participação juvenil efetiva. Podem até “participar”, mas não podem decidir. Isso é participação?
Quarto: as propostas pensadas para a juventude do campo parecem desejar resolver uma demanda das cidades. Se a cidade entende que a causa da violência citadina vem do seu inchaço e se este inchaço é provocado pela juventude que não encontra lugar de vender sua mão de obra no campo, logo se deve promover, através dos seus representantes políticos, as possibilidades da continuidade da vivencia destes jovens no campo, através de empregos e de ocupação da mão de obra de forma precária, eufememisticamente denominado esta “ação de política pública” de sucessão rural.
Quinto: a produção literária sobre a juventude rural carece muito de muito incremento. Precisamos de saber quem são estes jovens de forma mais aprofundada; como eles vivem? O que eles desejam? Por que eles desejam isso e desejam assim? Quanto lhes custa desejar desta forma? Como fazer para contribuir com estes desejos? Estes desejos são seus ou são desejos de outros/as nas suas falas???
Ao e tratar de sucessão, pergunto: suceder o que? Pais e mães que chegaram a 50 (cinquenta) anos com cara de 80 (oitenta)? Pais e mães que devido o fato de não ter podido estudar as vezes nem documentação tem,? Que dirá dinheiro, respeito e representatividade? Pessoas que não possuem um pedaço de terra para plantar, mas que todos os anos por uma imposição religiosa ( ainda creem que o ato da chuva é mais divino do que humano) ? Realizam passeatas, denominadas de procissão, entendendo que a vida da chuva vai melhorar a sua vida?.Quando a chuva chega enche o tanque de quem tem terra e molha a terra de quem a possui. Está longe de mim, querer que não chova, adoro a chuva, mas se chovesse o ano todo por aqui a vida do meu povo não estaria melhor. O problema é bem maior.
DAS PROPOSTAS DE UNS “JOVENS”
Tristemente observo que as demandas apresentadas pelas juventudes em 2003 são as mesmas que são apresentadas hoje 9 (nove) anos depois. E a cada dia as cidades se incham mais e o campo diminui em população. Mesmo com tanta maldade imposta O RURAL NÃO VAI ACABAR. O que precisa de acabar urgentemente é uma leitura atrasada de achar que se vive no campo o jovem necessita apenas de trabalho e que se o lugar é o campo precisa só de chuva porque só se visa a agricultura.
Ora, de 13 (treze) ações propostas do Plano Estadual de Juventude da Bahia, (dec. Nº 18.532/2010) um trata da participação, outro fala de cursos à distancia e 11 (onze) da geração de renda. Jovem rural não é bicho que só precisa de trabalho para viver.
Entendo que há uma construção de “intelectuais” para incitar os jovens do campo a se inclinarem sempre para a geração de renda e as entidades sindicais tem dado relevo a isto. Neste aspecto as formações promovidas nestes espaços tem isto por premissa. Senhoras e senhores: esta proposta responde a necessidade de quem? Uns dizem ora são os/as jovens que dizem. Sim, só falamos do que conhecemos, primeiro apresentemos outras possibilidade que no campo também pode ter e depois se indaga; não é dizer primeiro o que pensa ser melhor e pede para a plenária de jovens aclamar.
Nas cidades há algo denominado de moratória social juvenil, isso significa que é o tempo em que o/a jovem deve ficar livre para se dedicar a estudar e se preparar para a vida. Quantos debates nesta linha ocorrem no campo? Por que nossos/as jovens tem que só ter o trabalho como possibilidade e ainda parecendo ser uma benesse dos governos estes cursos de formação? As propostas de construção de uma identidade juvenil no campo na linha da educação do campo ocorre e ocorre muito e defendo entusisticamente. Mas neste campo somente a educação do campo da conta? E a elevação de escolaridade? Sabendo que nosso estudo no campo é muito precário ainda, cadê as propostas de cursinhos pré-vestibulares nas associações, sindicatos para preparar jovens para o acesso ao ensino superior? Se sabemos que a elevação de escolaridade não define de per si contribui enormemente, para uma melhor colocação social. Será que tem gente com medo destes meninos e destas meninas se tornarem “melhores” que estes?
A intenção é a de preparar uma categoria estigmatizada das diversas no campo para ser mandada e uma categoria de citadinos para serem os mandantes. E o que afirmo aqui não respeita os recortes. Dento dos mesmos recortes há menos influencia e interferência dos/as jovens do campo. #fato. Por se falar em #fato os/as jovens do campo que estudam participam das redes sociais e até muitos que não estudam também acessam. Onde estão as propostas para o campo de democratização da internet pra nois vê na roça. É necessário respeitar uma expressão linguística que comunica como qualquer outra no mundo. Até o forró que é algo bem representativo do campo para ser inserido entre os jovens das cidades foi necessário se transformar em “forró universitário”. Ora, onde se localizam as universidades? Pé de serra tem nome de bocó? De atrasado? Não merecemos ter que mudar para sermos respeitados/as. Queremos um campo de oportunidades.
Senhoras e senhores, operadores da decisão dos direitos da juventude do campo brasileiro: geração de renda pode e deve ser uma possibilidade também no campo, mas não a obrigação como única saída; lazer é bom e todo mundo gosta, mas, não vislumbro a construção de equipamentos de lazer para o campo, respeitando inclusive a participação feminina. O que fazem as meninas do campo brasileiro para a prática esportiva? Debater a construção de universidades seria de bom tom, não? Construir universidades respeitando limites territoriais ajudaria as/os jovens do campo terem outros espaços de discussão e de empoderamento, certo? Discutir lazer e tempo livre contribuiria e muito para que nossos/as jovens pudessem imaginar o que fazer quando “não se tem o que fazer”.
Caras/os, reafirmo as políticas apresentadas pelos movimentos juvenis ou que representam as juventudes do campo e suas idiossincrasias, no entanto devo afirmar, por conhecimento de causa e por aporte teórico, mesmo sem citar algum neste texto que estas não dão conta de toda a nossa juventude.
Ser jovem é mais que trabalhar e campo é mais que agricultura. Dá para entender que a juventude do campo quer e necessita de um pouco mais do que o campo apresentado para esta juventude?
1. Este texto nasce devido a necessidade percebida do alargamento da concepção de campo, ruralidade e juventude para o campo brasileiro e baiano a partir dos acúmulos de participação e de leituras sobre a juventude do campo.
2. Jocivaldo Bispo da Conceição dos Anjos é conselheiro estadual de juventude representando o Coletivo Regional Juventude e Participação Social – CRJPS.
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