O TEMPO DELES OU OS NOSSOS: O QUE SIGNIFICA PROPOSIÇÃO DE ATIVIDADES PARA ESTUDANTES QUE SE ENCONTRAM COM AULAS SUSPENSAS POR CONTA DA PANDEMIA DE CORONA VIRUS?
Sem avisar, chegou o desafio para a rede de educação brasileira. Toda a rede. Públicas, privadas, presenciais, semipresenciais, sem mediação... negros, brancos e demais cores, raças e etnias; pobres ricos e a diversidade que contempla a classe do meio... todo mundo precisa de organizar o currículo para este tempo. Todos. Inclusive os remotos esquecidos e forçados a engolir o padrão: indígenas, quilombolas, ribeirinhos e demais comunidades tradicionais. Estes são, talvez, o maior dos desafios. Pois, suas metodologias e epistemologias, pouco apreendias e valorizadas poderiam pelo centro do poder que constroem o currículo, neste momento, para além do sempre, ser um modelo de uso possível e necessário para o momento.
Destinar um tempo para refletir as formas de organizar os processos apresentados para os estudantes se faz mister. Pois, este público apesar de não estar na faixa de riscos de vulnerabilidades do vírus Corona, se encontram em fase formativa e com energias o suficiente para usar de todas as formas e pode transgredir, com mais facilidade, as ordens impostas. Precisamos de pensar neles. Pensar com eles. Pensar sobre eles. Ah! E elas também! Contemplando no trajeto êlas e demais representações.
Já não cabe outro modelo de proposta que não seja a da Educação a Distância. E, leia-se, mesmo para os cursos que já não são presenciais as abordagens pedagógicas e metodológicas precisam de serem atualizadas de acordo com as dinâmicas da conjuntura. Não são cursos para quem trabalha e estuda e têm um tempo especifico para o estudo. São propostas para quem, doravante, até durar a Crise do Corona, terá tempo “de sobra” livre. Tempo livre de sobra não necessariamente é tempo livre para estudar. E estudar e apreender não é jamais o uso do modelo cartesiano organizado para servir ao sistema capitalista que temos adotado. Que tenhamos isso como perspectiva na elaboração das propostas. Logo, cabem algumas reflexões:
1. Organizar propostas para serem apresentadas para os estudantes, que terão aulas repostas quando a crise passar, precisa de ser leve. Ser leve que dizer que não pode haver cobranças, que sugestão não pode ser sinônimo de orientação e prazos. Mas, conteúdos, inclusive, que contribuam para a libertação dos aprisionados. Conteúdos, métodos e a episteme precisam de libertar pessoas que estão em diálogo constante com elas;
2. Que a flexibilidade curricular tão propalada precisa de materialidade. Ou seja: o tempo que os estudantes estão em casa não são tempos somente para estudo e precisamos de apontar que eles tenham mais condições de experimentação de outros aprendizados;
3. Isso não quer dizer que devemos dispensar as proposições a serem feitas. Jamais. Devemos apresentar possibilidades para além das palavras. Mas, em métodos. Somente devemos retirar o caráter da cobrança das proposições e lembrar do abalo psicológico porque passam os estudantes neste momento. Aliás, não são estudantes no momento. São “refugiados” em casas por imposição político-sanitária.
4. Que tal se a gente falasse para eles em alguns diversos momentos avaliassem as disciplinas e conteúdos e usos práticos na vida deles. Que perguntássemos sobre o tesão deles pela escola? Do que motivam eles a irem para a escola? Sobre o que pensam da vida e como cada disciplina pode ajudar nisso. E, em vez de somente eles fazerem os diários de bordo, a gente fazer o nosso a partir da oitiva deles também. Aí sim avançaríamos em valores e percepção de sujeito e gente por pare dos estudantes. Porque temos tempo também, neste momento, de compilar algumas orientações que possam vir da contramão neste momento;
A situação atual orienta para que avancemos para pensar em educação remota de forma mais ampliada e que possamos pensar e orientar o tempo livre da juventude. Vivemos num país da produtividade em que o tempo livre sempre foi visto como o tempo a ser preenchido para não virar a “morada do diabo”. As propostas de uso deste tempo não podem ser somente isso. Aliás, não pode ser isso, jamais. Pois, esta cobrança de produtividade é pensar a ocupação dos meninos e meninas para servir a quem sempre serve diariamente em nossas unidades escolares. Servem aos vencedores.
O tempo é o tempo deles. Deveria ser isso sempre! Precisamos de aceitar entendimentos epistemológicos deles sobre assuntos, inclusive, por formas de comunicação não convencionais como a fala. Um texto ouvido e com a resposta em áudio de WhatsApp com uma capacidade epistemológica apresentada não pode ser um instrumento para este momento tão somente. Agora precisamos mais ainda. Mas, isso deve ser o quefazer de uma rede de educação que valorize a pluralidade e a diversidade de formas e modos de vidas e de gentes que o compõe. E perguntas feitas e respondidas pelas rádios comunitárias? E rádios postes? E toda a parafernália de aplicativos e possibilidades comunicativas não valorizadas pela sociedade da escrita e da grafia que se ostentam como a deusa do conhecimento. Nada que não for grafado tem tido valor para a educação vida de regra. Nada.
Se por vídeos, se escrito, se falado, se desenhado ou outras formas comunicacionais, as expressões de apreensão do conhecimento precisam de serem valorizados e positivados pelo processo educacional que pula os muros das salas de aulas e passam pelas frestas das janelas e portas. Isso ajuda inclusive a eles mesmos a respeitar as origens de seus pais e avós e o não uso da grafia enquanto via comunicativa de forma direta. De forma direta sim. Não tem currículo oculto e forma indireta de expressão se prensarmos no sujeito holístico. Se falamos, precisamos de construir condições para ser.
Propor atividades pedagógicas domiciliares para estudantes que enfrentam diversos problemas, psicológicos em especial e com uma grande gama de estudantes empobrecidos (que não se sabe o que é afastamento preventivo pela imposição do capitalismo vivido) , provocado por este modelo de educação que temos e construído no Brasil, é perder a oportunidade de aprender com o momento e apontar possibilidades reais de avanços curriculares. Eles podem mais. Que tenhamos capacidade de acompanha-los. E em tempo, Viva Paulo Freire! Vivamos!
Jocivaldo dos Anjos
25/03/2020

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