PRETAR NA BAHIA

PRETAR NA BAHIA Achille Mbembe em seu livro Critica da Razão Negra afirma que no mundo se confunde sempre enquanto categorias pretos e africanos. Pois, em qualquer parte do mundo em que se ver uma “pessoa de cor” se pensa que aquele (a) sujeito (a) se trata de um africano (a). Por seu turno, a Bahia, pode ser considerada, respeitando as proporções devidas, no mesmo arcabouço avaliativo. Pois, no Brasil, onde se observa um (a) preto (a) entende-se que aquele (a) se trata de um (a) baiano (a). Preto e baiano também se confunde no Brasil. Mano Brow, líder do maior grupo de RAP no Brasil, o Racionais MCs, orientador de gerações, numa de suas canções mais conhecidas (Vida Loka 2) em uma passagem diz que “preto e dinheiro são palavras rivais”. E segue na letra estimulando o povo preto a seguir na labuta. Tanto Mbembe quanto Brown estão certos a meu ver. A aproximação do corpo preto ao corpo africano e da pobreza ao preto, bem como da Bahia à pretidão fazem parte do simbolismo imaginário. Mas, na Bahia, em especial, preto tem também outros contornos. E pretar precisa de ser um verbo no presente do indicativo e entender que indica muito nos indicadores os sentidos da “cor da noite” em corpos baianos. Pretar na Bahia, bem como em todo o país, precisa de ser uma partida para a constituição de políticas públicas. A BAHIA EM NÚMEROS Na Bahia, conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Continua (2018) 81,1% da população é negra. Estes negros vivem na zona urbana em sua maioria, sendo que somente 28% residem na zona rural. Em comparação com o ano de 2012 teve aumento do número de negros. Este número era de 79,5% da população e entre os rurais houve diminuição, que era de 29,1%. (SEI, 2020). Para a diminuição dos rurais vale outras leituras (ANJOS, 2017). Os pretos baianos possuem em sua maioria idade entre 40 e 59 anos, seguidos por quem tem 25 a 39 anos. Em relação a 2012 a população com idade entre 6 e 14 anos mudou de 16% para 13,2%. Isso pode ser explicado pela diminuição na taxa de natalidade entre o povo preto, devido ao planejamento familiar, o que contraria a ideia de que os programas de transferência de renda estimulariam as famílias empobrecidas, em sua grande maioria negra, a procriar em maior medida. Na Bahia se ensaia, e bem, mas, não faz gol, necessariamente. Em se tratando da longevidade o povo negro, que em 2012 somente 11,4% chegavam ao sexagenarismo, em 2018 subiu para 13,7%. Já entre os brancos, em 2012 13,8 tinham mais de 60 anos e em 2018 são 16,8%. (SEI, 2020). Os brancos vivem mais na Bahia. Conforme os dados. O Brasil constitui-se de uma população de aproximadamente 209 milhões de pessoas. Destas 14,7 vivem na Bahia, o que corresponde a 7,1%. Em relação ao nordeste a Bahia possui 26,1% do total do total dos 9 Estados. Na Bahia 58,2% da população era de pardos em 2018, 22,9% de pretos, 18,1% de brancos e 0,8 de amarelos e indígenas (SEI, 2020). A Bahia, com 81,1% de pessoas declaradas negras ostenta o segundo lugar no Brasil em relação a população de negros, ficando atrás do Amapá somente que tem uma população de 81,3%. Sem embrago, em relação aos declarados pretos a Bahia possui o maior contingente com 22,9% e em segundo lugar está o Estado do Rio de Janeiro com uma população de 13,4% (SEI, 2020). Se a Bahia não é um Estado preto é o Estado mais preto da federação. “TRISTE BAHIA O QUÃO DESSEMELHANTE” Em prosa, verso, preto, fome e sangue se canta a dessemelhança na Bahia. Não é baiana porque não nos pertence. Mas, está na Bahia porque nos atinge. E muito. A taxa de ocupação na Bahia para quem tem 14 anos ou mais é de 12%. Ao se dividir entre negros e brancos temos os negros com 14,1% e 9,5% entre os brancos. Por isso que indicadores com IDH, PIB e demais planificadores acabam por esconder muito do que mostra. É preciso ir mais a fundo. A PNAD 2019 por amostra trimestral aponta que da força de trabalho 81,6%, o que equivale a 5.687 mil pessoas na Bahia é formada por negros, e, 79,9% (4.010) pessoas que estão fora da força de trabalho também são negras. Tem mais força de trabalho negra, mas também tem mais desemprego negro. Estar apto não necessariamente significa ser “aproveitado”. Dentre os brancos o desemprego pela população branca era de 14,8% e entre os negros era de 17,2%, enquanto o total de baianos é de 16,8%. A hecatombe que desnuda o racismo e o machismo e sua intersecção aponta a disparidade em relação às mulheres negras na Bahia. Enquanto o desemprego diagnosticado entre homens brancos era de 12,2%, entre as mulheres negras era de 20,3%. Homens negros com 14,8% e mulheres brancas com 17,6%. Isso orienta que políticas reparatórias não pode ser uma tendência ideológica do partido que governa, mas uma necessidade de governo para qualquer gestão que se comprometa em equanimizar a sociedade. Ser preta na Bahia é caminhar lado a lado com o desemprego. Isso responde pelo nome de interseccionalidade entre racismo, sexismo e machismo que se interagem e corta corpos a partir das orientações estruturais da sociedade. O mais grave destes dados é que eles tendem a aumentar e tem aumentado. Não estacionou ou apresenta curvas. Pois, no ano de 2012 estes números eram de 14,4%. Isso desnuda que os governos neste período não fizeram ou fizeram muito poucas ações para a diminuição das dores que as mulheres pretas acessam (SEI, 2020). As áreas articuladoras e finalísticas das políticas para estes segmentos necessitam de um plano e sua aplicação de forma mais corajosa no sentido de organizar todo o governo neste sentido. Na Bahia também tem os pseudos donos de si. Os denominados empreendedores individuais, que vivem na logica do desigual e combinado, teoria construída por Leon Trotsky e apresentada com o recorte de raça no Brasil pela maestria de Lélia Gonzales. Estes trabalhadores por conta própria na Bahia somam 29,3%, enquanto os de carteira assinada é de 25,1% e os empregados sem carteira assinada são 18,6%. Nestas três categorias ocupacionais 70,6% era de brancos e 73,6% era de negros. Mas, quando se desmembra os dados os com carteira assinada possuía a maior predominância de pessoas brancas. Em se tratando de faixa salarial os homens brancos receberam o valor de R$ 2.488,00 e as mulheres negras, segmentos com maior hiato, recebe R$ 1.286. E pasmemo-nos se pudermos, caso não, apenas entendamos: as mulheres negras possuem a mesma media de estudo que o homem branco, que é de 8 anos de estudo. As mulheres negras possuem ainda a maior média de alfabetização no Estado. Outro recorte ainda chama a atenção, que é a divisão rural e urbano. Os negros da roça recebem R$ 711 e os negros da cidade recebem R$ 1.516. as divisões geográficas causam, produzem e reproduzem cotidianamente, a partir das suas diferenças, as desigualdades que assolam a vida do povo no Estado da Bahia. Imaginemos ser mulher, preta e roceira na Bahia. Agora imaginemos as políticas que não apresentam recortes desiguais, na medida de sua desigualdade, para estes acessos. O que isso produz para este Estado de saldo? Quanto as doenças a Aids e Tuberculose acometem mais pretos e pardos, mas aponta queda entre 2012 e 2019 em todos os grupos étnicos no Estado. Enquanto que a tuberculose acomete mais do dobro de pessoas negras em comparação às brancas e a hanseníase se concentra mais entre os brancos A taxa de homicídios de brancos por 1.000 habitantes correspondeu a cerca de 30% da taxa para os negros (SEI, 2020). Os dados informam que foi 14,6 para brancos e 45,9% para os negros. Negar avanços no acesso às políticas é negar a própria história e usar da mentira pra ser percebido. Bem como negar o desigual acesso às estas políticas também. Não perceber que a existência destes fenômenos orienta, para ontem, que as políticas reparatórias precisam de ser mais arrojadas no sentido de caminhar para a igualdade de condições de acesso e uso é atuar contra o povo preto. Se não há neutralidade na sociedade, na política também não há. A politica interseccional de reparação se trata de uma necessidade que obriga os governos e toda a sociedade de colocar lupa grande recheada de estratégia e recursos para investir nas categorias de pretos e pardos, muito mais em pretAs, com vistas a garantia de um Estado onde caibam todas as pessoas que nele convive. Sigamos!. Joocivaldo dos Anjos 05/12/2020

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