Quando a morte é celebrada
Quando a morte é celebrada
É incomodante no Brasil o preto sem dono. Preto sem dono não merece de existir. Esta máxima tem sido utilizada para controlar corpos pretos desde a mais douradoa escravidão da história nas Américas, que foi a implementada sobre o povo vindo forçadamente de África em Navios negreiros. Na viagem ficavam alguns corpos indomados no mar. Na chegada outros tantos indomados na terra e quando não se “adaptava a hospedagem”, mais uma pá de corpos eram empilhados e expostos para ensinar aos demais o significado de corpo negro em terras tupiniquins. Assim o Brasil se fez. Sobre corpos negros desalmados, sobre sangue de preto jorrado e sob a sensação de uma não gente a vagar na terra.
Após as quase quatro décadas de escravidão forçada no Brasil algumas coisas mudaram no sentido da inclusão dos descendentes deste povo. Especialmente na primeira década deste século. Mas, ainda persegue na mente deste país a ideia de não gente. Avança-se na ideia de inclusão até, mas, a inclusão não pode ter o próprio preto como o gestor, coordenador da ação porque em muitas mentes ainda estes não são dotados de condições das diversas ordens para isso. O que afirmo acima se trata das pessoas e de instituições (que são formadas e orientaras por pessoas) todas como progressistas. Na outra parte estão os que nem tergiversa em afirmar que preto não possui condições de condução de ações complexais de fato. Ações como coordenar e gerenciar pessoas. E assim segue-se a ideia da raça a ser dominada. A chacina que ocorreu em Jacarezinho - RJ, que foi a maior já ocorrida no Estado e já se sabe de pelo menos 28 pessoas mortas não se trata de um ponto fora da curva. Faz parte de todo o script plasmado no Brasil para o povo preto.
O território do preto é o território negado. Mas, que mesmo negado, precisa de ser controlado. E controlado de forma onisciente e onipresente. Não se é permitido território onde preto não tenha uma “mão de ferro” que lhe diga o que fazer. Afirmando isso jamais quero concordar com a existência de um Estado paralelo em qualquer lugar do mundo que seja. Mas, devo perguntar. Onde fica o Estado positivado pela lei que não percebe este povo como gente para orientar, construir e implementar políticas públicas para o povo deste local?
A cor quando juntada ao grau de escolaridade,renda, local de moradia e outros atributos cria uma intersecção que a interpretação utilizada tem sido a do medo e, por consequência, do controle. Pessoas destes lugares não tem direito a uso de algumas palavras, expressões e vivências.
Imaginemos que nestes comunidades hajam pessoas que desejam ser hippies. Logo considerar-se-ão como mandingos. Enquanto os dos bairros nobres poderão usufruir da palavra bonita para expressar o que significa a cor neste país. Imaginemos que nestas comunidades existam pessoas que se afeitam ao uso de substâncias ilícitas psicoativas. Somente para uso. Que sejam trabalhadores como os dos bairros nobres e queriam “destrair a ideia com o back”? Estes na serão considerados traficastes enquanto os dos lugares autorizados serão considerados usuários e, ainda com a possibilidade de serem considerados pessoas com necessário de tratamento e acompanhamento por equipes especializadas de saúde. Aos da comunidade deve ser dito e redizido o mantra C: “crime, caixão, cadeia, cemitério”. E assim segue e se organiza o tripé da narrativa: corpo, território, renda.
Senhores, o que se justifica entrar numa comunidade e assassinar quase três dezenas de pessoas, ainda que a corte suprema do país tivesse proibido a entrada da polícia por conta da pandemia? Somente a ideia de quem ali não vive gente. Ali todo mundo tem dívidas legais e pode varrer. E, como no passado, deixa alguns observando para aprender o que não se deve fazer. Quando falamos sobre o direito à vida, nos chegam alguns néscios néscios para dizer: “vocês do direitos humanos somente defende bandido”. Afirmamos: defendemos a vida é a lei. O direito ao uso da lei em todos os casos. Em nenhum artigo da constituição ou do código penal existe a inscrição que a execução é autorizada. E mais: que o Estado esteja presente diariamente para punir quem erra e oportunizar a vida digna com condições para todos. Inclusive para os que erram e consigam criar possibilidades para que o “erro” não seja o único alcance destes olhos. Mas, a única coisa que consegue me fazer entender a celebração de tantos corpos é a nossa cultura de considerar este tripé: corpo, território e renda, como o orientador do desamor e do ódio neste país.
Tudo é projeto. Nada é por acaso. Desde o aumento dos espaços de cultos religiosos nestas comunidades ao controle dos usos de bens de consumo e a escassez de políticas públicas organizadoras destes espaços geopolíticos. Este espaço não pode dar certo sob jugo de o projeto de Brasil que foi e é organizado dar errado. Estes lugares precisam de dar errado para provar que o darwinismo social estava certo. Este povo precisa de ser confirmado como uma raça errante e fadadas ao fracasso. É horrendo, mas, é verdade. Este é o projeto.
Jocivaldo dos Anjos
09/05/2021
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